Apresentado mais uma vez nos EUA como voz moderada do governo brasileiro, o vice-presidente Hamilton Mourão precisou explicar declarações controversas de Jair Bolsonaro em entrevista ao jornal americano The Washington Post publicada nesta segunda-feira (15).
Questionado sobre o discurso do presidente em relação ao nazismo, por exemplo, o vice afirmou que muitas vezes o presidente se utiliza de “expressões fortes” para tratar de temas com carga ideológica e que “não acredita totalmente” quando diz que o movimento de Adolf Hitler na Alemanha pode ser considerado de esquerda.
Segundo Mourão, que esteve nos EUA na semana passada para uma série de compromissos considerados de contraponto ao presidente, Bolsonaro quis endossar a ideia de seu ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, para que ele “não ficasse sozinho” na defesa dessa tese.
Em visita a Israel, no início de abril, Bolsonaro afirmou que “não há dúvidas” de que o nazismo foi de esquerda.
Antes disso, o chanceler havia dito que era possível ver “semelhanças e proximidades entre esses movimentos nazistas da Europa da metade do século 20 e movimentos de extrema esquerda” -a tese é contestada pela maioria dos historiadores, incluindo os especialistas do memorial que documenta o extermínio de 6 milhões de judeus pelos nazistas.
“Algumas vezes ele usa expressões fortes”, disse o vice sobre o presidente, acrescentando que Mourão diz que a declaração de Bolsonaro em Israel sobre o nazismo e a esquerda foi feito “talvez para fazer com que [Ernesto] Araújo -quem fez originalmente o comentário- ‘não se sentisse sozinho'”.
“Mourão sustentou que Bolsonaro provavelmente ‘não acredita totalmente’ na linha que ele pareceu endossar”, diz a reportagem.
À época da fala do presidente e seu ministro, o vice se contrapôs ao discurso de ambos ao dizer que “de esquerda é o comunismo. Não resta a menor dúvida”.
Mourão tenta desfazer a ideia de que está se comportando como um antagonista dentro do governo e, apesar de admitir que Bolsonaro seguiu por um “caminho errado” nesse debate, questões sobre direita e esquerda, ele defende, “precisam ficar para trás”.
“Eu acho que ele [Bolsonaro] queria marcar uma posição, mas talvez tenha ido pelo caminho errado”, declarou o vice ao The Washington Post. “Mas essas são coisas do passado. Nós temos que entender que nesse novo mundo no qual estamos vivendo essas questões sobre direita e esquerda precisam ficar para trás”.
Mourão também foi questionado pela publicação dos EUA sobre os comentários do presidente em relação ao golpe de 1964 no Brasil -que Bolsonaro não considera um golpe. O presidente estimulou celebrações no país para marcar os 55 anos do início da ditadura.
Segundo o vice, a opinião do presidente é “simplesmente sobre história” para satisfazer alguns integrantes de sua base que podem ter nostalgia por aquela época. Ele acrescentou ainda que o governo está “marchando em um bom caminho” para a implementação de mudanças, incluindo a reforma da Previdência, leis sobre segurança pública e maior desregulamentação da economia.
De acordo com o jornal americano, Mourão está “longe do nacionalismo acalorado que caracterizava a campanha eleitoral de Bolsonaro”, principalmente sobre questões contra minorias, e insiste que a verdadeira crença do governo é o liberalismo.
A publicação cita as opiniões do vice sobre evitar uma guerra comercial com a China e uma possível intervenção militar na Venezuela -ao contrário de Bolsonaro, que já flertou com ambas as ideias em uma tentativa de alinhamento automático com o governo americano de Donald Trump.